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TECELAGENS DE SI E DO MUNDO: NARRATIVAS DE MULHERES RETRAMADAS E DESFIADAS

Das muitas estórias acerca da tecelagem, temos em Metamorfoses de Ovídio a vingança de Atena contra a tecelã Aracne. A deusa, renascida da fronte de seu pai, o Zeus helênico, vai espionar a humana em seu ateliê. Disfarçada de velha, insta-a a reconhecer a superioridade divina no manejo do tear, mas recebe como resposta somente a presunção de Aracne ao desafiá-la. Incitada a provar a que veio, Atena coloca seu tear ao lado de Aracne e ambas iniciam sua competição. Enquanto a deusa bordava os monumentais símbolos da sabedoria helênica, Aracne optava por representar os crimes dos deuses olímpicos contra as mulheres, trazendo à baila de seu alinhavo desde Leda à Astéria. Ao término de metros e metros de filigranas e bordados, Atena não pôde deixar de reconhecer a superioridade da obra da humana Aracne. Esmurrando-a, Atena também reduz a trapos toda dura prova da violência de seu pai e de seus irmãos. Atormentada e desesperada, Aracne é transformada em aranha, fragilmente pendurada por um único fio de segurança: “Viva, menina maldita, mas fique pendurada. E para que não espere nada melhor do futuro, que o mesmo castigo recaia sobre sua geração e seus descendentes”. Assim transformada, o que restou a Aracne é recomeçar sua tecelagem. A tragédia de Aracne nos lega tanto fado, quanto fortuna. Fado, pois castigo. Fortuna, pois metamorfose. Do mesmo modo que este mito grego, como tantos outros compilados por Hesíodo, aponta o advento do patriarcado, ele oferta também uma valiosa clave de reelaborações de conflitos históricos: a tecelagem de si e do mundo. Desejamos, com esta apresentação, discorrer acerca dos modos com que a tecelagem pôde servir material e miticamente para a construção de si e do mundo nas narrativas de mulheres. Nosso objetivo é mostrar a íntima relação entre a atividade da tecelagem com o ato de contar histórias como histórias de resistência.

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