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A PINTURA COMO REGISTRO DE MEMÓRIAS E ESTRATÉGIA DE SOBREVIVÊNCIA: REFLETINDO COM A ARTISTA MAKUXI CARMÉZIA EMILIANO

Nos povos em que predomina a oralidade, histórias são recontadas de geração em geração e não se separa o narrado do vivido (GOODY, 1996). Saberes são transmitidos por grafismos, canções ou pelo próprio corpo – suporte de ensino e aprendizagem (CLASTRES, 1978). Como explica Davi Kopenawa: “Nossos pensamentos se expandem em todas as direções e nossas palavras são antigas e muitas. Não precisamos, como os brancos, de peles de imagens [papeis escritos]” (KOPENAWA, 2015). Porém, à medida que o contato com as sociedades envolventes se intensifica, a produção de imagens figurativas se revela uma nova estratégia para o registro de conhecimentos e memórias indígenas, e, ao mesmo tempo, uma fonte de renda. Carmézia Emiliano, do povo Makuxi, foi uma das primeiras a fazer isso, no Brasil. Saiu da aldeia jovem, nos anos 1990, e descobriu na cidade a pintura sobre tela, com a qual passou a materializar lembranças de plantações de mandioca, banhos de rio, rituais e narrativas míticas. \\\\\\\"Pinto para não esquecer\\\\\\\", afirma. Com base em uma etnografia multissituada (MARCUS, 2001), que realizo há cinco anos em exposições, redes sociais e interlocuções com artistas e curadores, discutirei o caso de Carmézia Emiliano e, a partir dele, refletirei sobre potencialidades e armadilhas daquilo que vem sendo chamado, no Brasil, “arte indígena contemporânea”. Para além dos riscos de “equivocação” diante de realidades incomensuráveis (VIVEIROS DE CASTRO, 2018), notam-se diferenças na maneira de conceber a propriedade intelectual e classificações problemáticas – como chamar de naif uma produção atravessada por tantos conhecimentos ancestrais.